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Uma Nova Era

Estudo e reflexão anulam os preconceitos de que a idade não pode oferecer novas oportunidades. Bom humor, empatia, compaixão e visão positiva dos fatos e do ritmo da natureza são amortecedores para o envelhecimento saudável
Todo novo ano é momento de reflexão. Costumamos pensar no que fizemos, deixamos de fazer e o que poderemos fazer nos próximos meses. Tenho o privilégio de ter vivido dezenas dessas oportunidades. Já pulei muitas ondinhas, fiz listinhas de desejos e oferendas.
Agora me preparo para viver uma nova era.
Como na transição entre a infância e a adolescência, noto mudanças em mim agora que o sol da minha vida está entardecendo. Algumas são físicas, outras emocionais. Nada grave por enquanto, exceto algumas dores na lombar e uma certa preguiça com assuntos chatos e pessoas muito sabidas. O que em outros tempos era um chamado para guerra, hoje deixo barato. Bem barato mesmo!
Tenho pouco tempo e muito que melhorar antes que seja tarde.
Estou aprendendo coisas novas, aprendendo com o que me dá prazer. Gosto de me envolver com o prazer, o que é bem diferente da luxúria e da volúpia. Estas, segundo o filósofo romano Cícero, quando intensas, corrompem o julgamento, perturbam a razão, turvam olhos do espírito, derrotam a razão. E atraem a ruína.
Como o bom senso e a sabedoria não são suficientes para nos afastar da devassidão (e você sabe bem como é difícil), Cícero agradece à velhice por nos livrar de deploráveis e insensatas paixões, afastando-nos das traições, violações, conspirações e outras torpezas.
Em Saber Envelhecer, Cícero afirma que “somente os idiotas se lamentam de envelhecer”, o que é uma verdade inegável. De fato, há pouco a reprovar no que entendo como uma vitória diante dos perigos dessa vida, especialmente num país cruel como o nosso.
Ainda assim há aqueles que reprovam e consideram a velhice detestável. E apontam suas razões: 1) ela afasta-nos da vida ativa; 2) enfraquece-nos o corpo; 3) priva-nos dos melhores prazeres; 4) aproxima-nos da morte.
São os rabugentos, mal-humorados e preconceituosos de sempre, que segundo o filósofo são deploráveis em qualquer fase da vida. Também acho. São vinhos amargos que só pioram com o tempo.
Concordo com eles apenas quando a velhice alcança o ponto de não retorno, quando já não existe saúde física e mental, independência e o desejo de viver se extingue. Nessa estação, a natureza que tanto nos ensina, deixa cair sabiamente os frutos maduros.
No entanto, a vida ativa não se resume a carregar um boi nas costas. Na velhice autônoma e saudável novas incumbências substituem a força bruta e a vitalidade dos músculos para revelar virtudes inéditas, descobrir prazeres adiados, cultivar com zelo as antigas amizades e fazer novas, exercitar o corpo e a mente, afastando qualquer ideia de tristeza, solidão e inutilidade.
As incumbências dos maduros são outras. Se a força e a agilidade física não autorizam grandes façanhas, elas podem ser substituídas por sabedoria, clarividência e discernimento cristalizados ao longo dos anos. É a hora de usar a musculatura mental.
Para muitos, o autoconhecimento, a experiência e a inteligência emocional tendem a permanecer estáveis, próximos à plenitude, mesmo quando o declínio dos sentidos se apresenta e as alterações na velocidade da memória se tornam inevitáveis.
Por isso, muitos povos reverenciam e preservam seus anciões como protegem suas crianças.
Estudo e reflexão anulam os preconceitos de que a idade não pode oferecer novas oportunidades. A decadência física pode ser adiada pelo cuidado pessoal, por ajuste dos limites e pelo abrandamento de antigos excessos. Bom humor, empatia, compaixão e visão positiva dos fatos e do ritmo da natureza são amortecedores para desfrutar de um envelhecimento saudável.
O imortal orador ensinou a seus ouvintes: “As melhores armas para a velhice são o conhecimento e a prática das virtudes. Cultivados em qualquer idade, dão frutos soberbos no término de uma existência bem vivida.”
Depois de anos de cultivo, é a hora da colheita que se aproxima, da fartura que apazigua a mente e a alma. É o tempo de colher os frutos dos afetos conquistados, de compreender e aceitar a finitude natural para contemplar a beleza inédita, o calor aconchegante e as cores douradas do mais lindo pôr-do-sol jamais visto.
Vida longa a todos nós! !!!
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